Estava eu às dez horas da manhã no supermercado escolhendo qual seria a salada do meu almoço (prefiro sempre mini rúcula e mini agrião, mas nem sempre encontro nessa loja 01) quando fui praticamente convidado a escutar uma conversa que acontecia via celular entre a gôndola do melão e a das uvas.
Um senhor, digamos, robusto, enchia seu carrinho com queijos e mais queijos quando seu querido Nokia N95 tocou. Antes de atendê-lo viu pelo nome no visor quem o interrompia naquele festivo ato consumista. “Cacete... Puta mulher chata!”, gritou como se estivesse vendo jogo do Palmeiras entre amigos na sua espaçosa sala de televisão.
Não me contive e fui para mais perto do senhor, tinha que ouvi-lo melhor – como diria o Lobo Mau. O diálogo começou, mas, antes, sua voz irritada passou para um tom doce, amigo... servil.
- Bom dia, Fulana (claro que não vou contar qual o nome da dita cuja)!
Vários Hum-hum foram repetidos e repetidos – e eu não vou inventar o que o outro lado falava porquê, claro, não consegui ouvir. O robustão tentou várias vezes cortá-la, mas era perceptível que a Malvina Cruela da história não deixava.
- Sim, sim, eu sei. Mas o que eu posso fazer? Você me mandou para essa viagem. Eu não consigo fazer nada daqui, só quando eu chegar em São Paulo!
Peraí, onde eu estou?, perguntei a mim mesmo. Será que fui para Paris sem ser avisado? Não, não,... Infelizmente não... Certifiquei a minha localização com o simpático repositor que também estava de butuca na história dos outros. Claro, pensei triste, continuo aqui na Brigadeiro Luis Antônio (lado dos Jardins, óbvio), praticamente esquina com a Avenida Paulista. Mais em São Paulo, impossível. Ou seja, o nosso protagonista, o robustão, é mentiroso.
- Chego só hoje à noite, no último vôo. Pode avisar ele que só vejo isso na segunda-feira? – Interrupção da Odete Roitman – Tá, desculpa... Eu sei... Tá, eu vejo no sábado, então... Tá, outro. – aqui um pergunta, a moça lá do outro lado mandou beijos ou abraços? Nunca saberemos...
Foi nessa hora que o dono do celular, o nosso protagonista-robusto, virou e me encarou. Seu sorriso sem graça quase me fez dar um abraço tipo Não-fica-assim-não. “Oi, Beto, tudo bem?”, ele perguntou vindo me dar a mão. Claro que também rezando para eu não ter escutado nada. Ambos sabíamos a verdade: eu ouvi tudo e conheço – muito bem – a pessoa com quem ele estava falando. Nós três, a Malvina Cruela, o robustão e eu já trabalhamos juntos numa importante empresa cujas ações subiram mais de 40% nos últimos meses.
Conversamos um pouco, contei do livro e ele prometeu estar na noite de autógrafos. Não precisei jurar que não contaria nada para a sua chefa-chefe. Ele sabe que não farei isso. Mas não me contive na despedida, e desejei boa viagem para o moço. Ele não respondeu e continuou em frente com seu carrinho de compras.
Não acho que o robustão esteja errado. Não mesmo. Aliás, acho muito saudável, até, dar uma cabulada ou outra no trabalho. É meio se sentir dono da sua própria vida. Se você nunca fez isso, faça. Escolha um dia com chuva – de preferência durante a semana e não de sexta ou segunda que dá muito na cara. Vá ao cinema às 3 da tarde, ou veja toda a primeira temporada de Lost. Diga que tem um compromisso, exame de estômago, fique gripado. E espante a culpa, hein. Com dor de consciência não tem graça enforcar um dia de trabalho.
E, agora, eu jogo uma pergunta para você com base no título deste post: será que tudo o que contei é realmente verdade? Será?
Beto Ribeiro, escritor, diretor, roteirista e produtor executivo de TV. Autor de Poder S/A e Eu Odeio Meu Chefe. Na TV, tem mais de 40 séries no ar: Série A3 (Amazon Prime Video), Filme B (Canal Brasil); Terra Brasil (Animal Planet/TV Cultura); Força de Elite e Muito Além do Medo (AMC); Prato do Dia (TLC); Investigação Criminal (AXN); Anatomia do Crime (Discovery).
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4 comentários:
eu acho que é verdade. todo mundo fica falando como se não tivesse ninguem do lado. e vai que eh mulher do chefe!
minha prima ficou metendo pau na empresa dela e no dia seguinte descobriu que a pessoa que tava do lado dela no restuarnte seria o novo gerente de rh da empresa. pegou mal.
Com certeza!!! para as duas questões!!
hahaha... Adorei!
Posso dizer sem culpa que sim, já fiz isso algumas vezes de ter "uma dor de barriga" e me dar um merecido day-off e por um dia me sentir dona da minha vida!!!!
Gostaria que meu chefe se permitisse isso uma vez na vida dele, coitado!
Espero que tudo isso é verdade, eu vou ter que começar a comer mais dessas coisas, a verdade é que eu realmente gosto de alimentos naturais, especialmente o que está aqui na entrega em Itaim Bibi.
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